A fibrose cística ou mucoviscidose é a doença hereditária autossômica recessiva resultante da transmissão de cópias anormais do gene do regulador transmembrana da fibrose cística (RTFC), localizado no cromossomo 7 (Elborn et al., 1991). A proteína RTFC, no organismo, se localiza nas superfícies apicais das células epiteliais e é um canal de cloro. A disfunção do canal leva a um distúrbio do transporte de cloro através dos epitélios (superfície luminal) e a um influxo compensatório de sódio para manter a eletro neutralidade com consequente influxo de água, o que leva a desidratação da superfície celular, com formação do muco espesso característico da doença (Campos et al., 1996).
A má-absorção na fibrose cística é predominantemente ocasionada pela disfunção pré-epitelial e decorre da rejeição de nutrientes não hidrolisados no lúmen pela insuficiente secreção pancreática. Em pacientes fibrocísticos, o pâncreas não produz enzimas suficientes para completa digestão dos alimentos ingeridos, as primeiras manifestações são a má digestão e má-absorção de gorduras. Os ductos pancreáticos ficam obstruídos por muco espesso, impedindo o suco pancreático de atingir o duodeno. A diminuição ou ausência de enzimas pancreáticas conduz à deficiência na absorção de lipídios, proteínas e, em menor escala, de carboidratos, causando esteatorréia, azotorréia e perda de vitaminas lipossolúveis. A baixa concentração de bicarbonato no suco pancreático faz com que o PH do duodeno seja ácido, e isso contribui para a má-absorção (Castro & Dani, 1993). Os problemas nutricionais e consequências da fibrose cística são multifatoriais e relacionadas com a progressão da doença. Fatores interdependentes, como deteriorização da função pulmonar, anorexia, vômitos, insuficiência pancreática e complicações biliares e intestinais, são responsáveis pelo aumento das necessidades energéticas, ingestão diminuída e aumento das perdas atribuídas à inadequação nutricional com consequente perda da massa magra e depressão da função imunológica (Creveling et al., 1997).
A intervenção nutricional na fibrose cística é de grande importância. Primeiramente, está associada com o melhor crescimento e melhora ou estabilização da função pulmonar. Em segundo lugar, a desnutrição tem muitos efeitos na função pulmonar, incluindo: diminuição na ventilação, na função muscular, na tolerância a exercícios e alterando a resposta imunológica pulmonar. Por fim, uma dieta rica em energia e gordura está associada a um melhor crescimento e maior sobrevida (Donald, 1996).
É fundamental desmistificar a restrição de gorduras. A dieta deve ser hipercalórica, hiperprotéica e com teor normal de gordura, considerando as necessidades da faixa etária para um crescimento e desenvolvimento normais, respeitando custos, hábitos alimentares e intolerância pessoal.
Os pacientes com Fibrose Cística têm necessidades calóricas elevadas, pelo próprio metabolismo, trabalho respiratório, infecção bacteriana e má absorção. Em geral, deve-se ofertar 20% a 50% de calorias além das necessidades para a faixa etária, observando-se o ganho ponderal e crescimento do paciente. Isto é mais importante que o cálculo apurado da dieta, é recomendável o dobro do normal de ingestão protéica e 35% da energia ingerida deve ser derivada de gorduras, pois a mal nutrição resulta no agravamento da doença pulmonar, por isso, há indicações de terapêutica de suporte mais agressiva, como sondas gástricas ou enterais e mesmo gastrotomia.
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